Atelectasia no Intraoperatório

Atelectasia no Intraoperatório

O conceito de atelectasia no intraoperatório foi proposto na década de 1960. A atelectasia intraoperatória é definida como o colapso do tecido pulmonar que ocorre durante ou após a indução anestésica. Ela é clinicamente caracterizada por redução da complacência pulmonar e comprometimento da oxigenação arterial.


A atelectasia está presente em aproximadamente 90% dos pacientes anestesiados, tanto durante a respiração espontânea como na anestesia geral. Representa em média 3 a 4% da área pulmonar total, podendo exceder 15 a 20%, principalmente após cirurgia torácica ou circulação extracorpórea. A distribuição desse colapso alveolar é heterogênea, maior nas regiões dependentes e subdiafragmáticas, e menor em direção ao ápice pulmonar.


Alguns pacientes apresentam peculiaridades na formação de atelectasia, como aqueles com doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), que têm menor incidência quando comparados a pacientes saudáveis. O mecanismo preventivo do colapso pulmonar nesses pacientes não está claro, podendo ser causado pelo fechamento precoce das pequenas vias respiratórias antes do colapso alveolar, resultando em mínima alteração na CRF.


A formação de atelectasia e a diminuição da capacidade residual funcional (CRF) durante o período intraoperatório são multifatoriais. Após a indução da anestesia geral, a pressão pleural torna-se positiva, em decorrência do relaxamento muscular, deslocamento cefálico do diafragma, peso do coração, o qual repousa sobre o parênquima pulmonar, e compressão das regiões dependentes do pulmão, imposta pelo peso do próprio parênquima pulmonar. Tais alterações permitem a formação de atelectasia por compressão. Quando o paciente com pulmões normais está em decúbito ventral, o peso do parênquima pulmonar é transmitido para as pleuras, gerando aumento na pressão pleural a incrementos de 0,25 g/cm2 no eixo anteroposterior, podendo chegar a 1 g/cm2 em pacientes com síndrome do desconforto respiratório agudo.


A transmissão da pressão imposta pelo parênquima pulmonar sobrejacente promoverá compressão das vias respiratórias e dos alvéolos inferiores, o que levará ao colapso pulmonar. De maneira semelhante, o diafragma relaxado após a indução anestésica é deslocado para dentro do tórax sob o peso das vísceras abdominais, promovendo compressão pulmonar e aumento da pressão pleural, com consequente redução da pressão transpulmonar nas regiões mais dependentes e caudais dos pulmões.


A atelectasia por absorção é aquela decorrente da absorção do ar alveolar sem preenchimento simultâneo por outro gás, seja proveniente do ar inspirado seja do sangue capilar. Ela ocorre no intraoperatório quando do uso de alta fração inspirada de oxigênio. Pode ocorrer, por exemplo, durante a pré-oxigenação, antes da indução anestésica, normalmente utilizada para prevenir a hipoxemia resultante da dificuldade de ventilação sob máscara e intubação traqueal. Nesse caso, a formação de atelectasias pode reduzir o tempo de apneia segura, isto é, o período até o desenvolvimento de hipoxia.


O fim da anestesia é outro momento no qual altas concentrações de oxigênio são geralmente utilizadas. Essa manobra é empregada com a finalidade de reduzir o risco de hipoxemia durante o despertar do paciente, podendo ser acompanhada da aspiração das secreções das vias respiratórias. Entretanto, a combinação de aumento da FiO2 e aspiração ocasiona colabamento alveolar. O uso de pressão positiva contínua sob máscara, a elevação da cabeceira do leito e o estímulo a inspirações profundas após a retirada da cânula traqueal são métodos que contribuem para o recrutamento pulmonar após a extubação.


Com o objetivo de minimizar o desrecrutamento após a extubação, o recrutamento alveolar ao final da anestesia deve ser acompanhado da ventilação com valores moderados de FiO2. No caso da necessidade de maior aporte de oxigênio, ele deve ser feito com parcimônia, de modo a não propiciar o colapso pulmonar, com consequente aumento do shunt e ocorrência de hipoxemia.


Outro fator também relacionado ao desenvolvimento de atelectasia intraoperatória é a disfunção do sistema surfactante. Tal alteração leva a comprometimento da função primordial do surfactante, prevenção do colapso alveolar pela redução da tensão superficial e estabilização da estrutura alveolar. A diminuição do surfactante, somada à ventilação mecânica, pode produzir aumento e heterogeneidade na atividade metabólica na região dependente pobremente ventilada, sugerindo aumento da inflamação local. Essa resposta inflamatória durante a ventilação mecânica está associada ao estresse mecânico regional, enfatizando a importância do correto manuseio da ventilação artificial no intraoperatório.


Para a maioria dos pacientes submetidos à anestesia geral, o retorno à ventilação espontânea e a deambulação precoce garantem que a maioria das atelectasias desenvolvidas durante a cirurgia seja revertida dentro de 24 horas, sem qualquer sequela clínica ou pulmonar. Contudo, em pacientes submetidos a intervenções cirúrgicas de grande porte, em especial torácicas e de abdome superior, formam-se grandes áreas de atelectasias, que costumam ocasionar maior duração de internação e necessidade de tratamento respiratório intensivo. Como consequência, pode ocorrer agravamento de lesões pulmonares já existentes.


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