Cirurgia endovascular: essência da cirurgia vascular
- 6 de fev de 2020
Desde a consolidação da cirurgia vascular como especialidade, grandes avanços foram alcançados: correção de aneurismas, uso de próteses vasculares, endarterectomias, revascularizações distais com veia safena etc. No entanto, outros caminhos ainda eram necessários. Em 1952, Seldinger apresentou a técnica de punção arterial, porta de entrada para os procedimentos endovasculares. A cirurgia endovascular tornou-se, então, parte integrante da cirurgia vascular.
Um singelo exemplo de cirurgia endovascular consiste na criação do cateter de Fogarty para embolectomias. Grüntzig, em 1977, desenvolveu o conceito do uso de balão para angioplastia arterial. Em 1991, Parodi introduziu stents aórticos como alternativa para o tratamento do aneurisma de aorta. Atualmente, realiza-se uma infinidade de procedimentos endovasculares.
Esse artigo não constitui um tratado sobre cirurgia endovascular nem uma revisão histórica, mas pretende indicar as inúmeras possibilidades nas diversas áreas.
- Cerebral/craniana: diversos procedimentos são possíveis em decorrência de microcateteres, fios guias adequados, fármacos, molas, colas e outros embolizantes, bem como stents. Os fibrinolíticos (rTPA) e equipamentos para trombectomia mecânica (lise pela injeção por cateter de salina pressurizada no trombo simultaneamente à aspiração deste) representam grandes ferramentas. Realizam-se angioplastias intracranianas, tratamento de acidente vascular encefálico (AVE) agudo, hemangiomas e malformações arteriovenosas (MAV), aneurismas, entre outros
- Vasos cervicais e troncos supra-aórticos: o tratamento endovascular das estenoses carotídeas ainda propicia debate entre o “best medical treatment” e a cirurgia aberta (endarterectomia); contudo, existem situações bastante precisas para sua adoção. Dispositivos de proteção cerebral, balões e cateteres adequados possibilitam ótimos resultados para a angioplastia das carótidas
- Aorta: grande avanço no tratamento de estenoses e, principalmente, aneurismas e dissecções, tanto no segmento torácico quanto no abdominal, minimizando o trauma da cirurgia aberta (Figura 1). Diversas táticas de abordagem possibilitam a correção de lesões complexas, preservando as artérias viscerais. Até mesmo na urgência (aneurisma roto), a cirurgia endovascular vem ganhando seu espaço
Figura 1. Reparação endovascular da aorta abdominal.
Crédito imagens: Dr. Marcelo Calil Burihan.
- Artérias viscerais: o consagrado, porém difícil tratamento cirúrgico do aneurisma de artérias viscerais, tem como concorrência a cirurgia endovascular, feita de diferentes maneiras, a partir da embolização dos aneurismas (utilizando-se molas, cola e partículas). Stents recobertos ou direcionadores de fluxo mantêm a perviedade do vaso
- Doença arterial oclusiva aortoilíaca: tratamento de oclusões/estenose significativas (Figura 2) e está entre as primeiras recomendações do Trans Atlantic Inter Society Consensus (TASC)
Figura 2. Angioplastia ilíaca.
Crédito imagens: Dr. Nelson Fernandes Jr. e Dr. Paulo Matsumura.
Hospital Heliópolis.
- Doença arterial oclusiva periférica (DAOP): o tratamento endovascular é com frequência a primeira opção de tratamento. A angioplastia transluminal percutânea, com ou sem stent, tornou-se cada vez mais frequente. Não se discutirá as características de abordagens dos segmentos femuropoplíteos ou infrapoplíteos, cujas indicações podem ser vistas no consenso TASC
- Trombose arterial aguda: trombólise química (rTPA) ou mecânica (lise pela injeção por cateter de salina pressurizada no trombo, simultaneamente à aspiração deste)
- Aneurismas de artérias periféricas: o tratamento endovascular (endopróteses) pode ser adotado em casos indicados das artérias femural ou poplítea
- Salvamento de acessos para hemodiálise: procedimento cada vez mais utilizado, considerando-se o prejuízo da perda de uma via de acesso. Reperfusão de veias profundas (fibrinólise química ou mecânica), com ou sem angioplastia/stent preservam/recuperam a via de acesso para hemodiálise, seja para o implante de um cateter ou para o salvamento de uma fístula arteriovenosa
- Varizes dos membros inferiores: métodos de termoablação (cateteres endolaser ou radiofrequência) associados ou não à cirurgia tradicional
- Escleroterapia de varizes com espuma ecoguiada
- Trombose venosa iliofemural: a fibrinólise química e/ou mecânica de veias profundas seguida ou não de angioplastia/stents em casos selecionados. O procedimento previne a morbidade tardia (síndrome pós-trombótica)
- Miomas uterinos: técnica de embolização das artérias nutrizes por partículas, evitando-se a histerectomia, o que pode preservar a fertilidade.
A lista de possibilidades para os procedimentos endovasculares é imensa: angioplastia coronariana, filtro de veia cava, varizes pélvicas, varicoceles, malformações arteriovenosas, síndrome da veia cava superior, traumas vasculares, embolização de tumores (terapêuticos e/ou pré-operatórios), shunt portossistêmico intra-hepático via transjugular (TIPS), síndrome de Cockett (angioplastia da veia ilíaca), entre outros.
Ainda não se tem um limite para o método. A criatividade dos cirurgiões vasculares, aliada ao desenvolvimento de novos dispositivos e materiais, objetivando sempre o bem-estar e o respeito ao ser humano, permitem avanços antes inimagináveis.