Como evitar o erro médico?

Como evitar o erro médico?

A vida em sociedade resulta do cumprimento de diversas normas de conduta. Essas normas derivam de usos e costumes sedimentados ao longo do tempo. As mais importantes se transformam em leis escritas e são impostas coercitivamente. Quanto maior o desenvolvimento da sociedade, mais complexo o corpo de leis. Por outro lado, maior será o grau de solidariedade ativa, com a consciência de socorrer para ser socorrido.


Não existe profissão mais regulamentada que a Medicina. A prática médica pode ser analisada sob o aspecto jurídico. Ademais, ações contrárias a médicos, nas diversas esferas jurídicas, têm aumentado; por isso, o profissional deve estar atento a prestar o melhor atendimento em todos os momentos de sua atuação, baseando-se em contínuo estudo e atualização, além de manter sempre uma adequada relação médico-paciente.


Erro médico × má prática médica × acidente imprevisível × resultado incontrolável


A conceituação do termo “erro médico” é muito complexa, e permite inúmeras interpretações, o que dificulta seu total entendimento. Aurélio Buarque de Holanda Ferreira define:


Erro: 1. ato ou efeito de errar. 2. juízo falso; desacerto, engano. 3. Incorreção, inexatidão. 4. Desvio de bom caminho; desregramento; falta.


Como se pode verificar, apenas com a utilização do vocábulo “erro” torna-se impossível determinar se há responsabilidade do agente (médico) quanto ao evento final. O “erro” pode derivar de um simples engano ou de um juízo falso decorrente de determinada situação, ação perfeitamente escusável. Por outro lado, pode ocorrer por falta, desvio ou desregramento nas ações do profissional que, ao não seguir os passos técnicos e éticos para a situação (por imperícia, imprudência ou negligência), contribui de maneira única para o fim indesejável.


Ao acrescentar o adjetivo “médico” (aquilo que pode restabelecer a saúde física ou moral) ao substantivo “erro”, a expressão formada (erro médico) adquire complexidade e dificuldade maiores do que as atribuídas a cada termo isoladamente. Aquele ou aquilo que pode restabelecer o bem-estar biopsicossocial de um indivíduo, não conseguirá ou deverá obrigatoriamente obtê-lo


Por outro lado, os  dois grandes pilares de sustentação da Medicina, em suas diversas especialidades, são a manutenção da vida e a minimização do sofrimento humano. Em situações não raras, devido à alta carga emocional, os pacientes e seus familiares podem não ter uma visão clara e precisa do que está realmente ocorrendo. Destarte, nesses casos, pode-se confundir “erro médico” com resultado diverso do desejado (evento indesejado) ou frustração com o tratamento médico


Segundo a jurista e professora de direito civil Maria Helena Diniz, erro médico, no aspecto jurídico, caracteriza-se como um mau resultado, involuntário, decorrente de trabalho danoso, causado diretamente pelo médico por imperícia, imprudência ou negligência; ou, ainda, que adveio de falhas estruturais decorrentes de condições inadequadas de trabalho ou de problemas com equipamentos médicos. Diferencia-se da má prática médica, já que o erro exprime uma fraqueza humana ou uma falha estrutural, enquanto a má prática médica se manifesta como a expressão da maldade, com a franca intenção de o mau profissional prejudicar seu paciente. Ou seja, neste caso existiria o dolo por ação ou omissão, com manifesta vontade do profissional em perpetrar sua conduta.


No acidente imprevisível, o dano decorreria de caso fortuito ou de força maior, quando situações inesperadas, ocorridas durante a atenção médica, não puderam ser evitadas por impossibilidade de previsão e prevenção. A professora define ainda resultado incontrolável como o produto de uma situação grave, relacionada diretamente com a evolução da moléstia e ligada a diversos fatores biológicos e fisiopatológicos somados à complexa e imprevisível relação doença/hospedeiro.


Embora o risco seja inerente à atividade profissional, algumas medidas podem diminuir ações que questionem a atuação do médico:


  • Orientação: instruir paciente, familiares e/ou responsáveis sobre a doença, seu prognóstico e quais o(s) tratamento(s) a ser(em) instituído(s), bem como os cuidados necessários para a recuperação
  • Termo de consentimento livre e esclarecido: obter autorização do paciente e/ou de seus familiares ou responsáveis após a informação e a compreensão adequada do(s) procedimento(s) a ser(em) realizado(s)
  • Prontuário médico adequadamente preenchido: médicos e membros da equipe multiprofissional de atendimento ao paciente devem preencher o prontuário de modo correto. Quem tiver acesso ao prontuário deve ter esclarecido as condutas adotadas, os resultados de exames, quais orientações e esclarecimentos devem ser prestados aos familiares, além da descrição de todos os horários relacionados
  • Atualização contínua: manter a atualização médica, por meio de instrução permanente e educação continuada, na qual as sociedades de especialidades detêm papel importante
  • Protocolos de condutas: criar protocolos e rotinas de atendimento que devem orientar, sem engessar, os médicos de determinada instituição
  • Avaliação de inadequações, discussão e definição de medidas preventivas: utilizar as desconformidades como uma oportunidade ímpar de revisão de todo o processo, com o intuito de buscar as causas e, sobretudo, discutir e encontrar maneiras de evitá-las
  • Relação médico-paciente adequada: o médico precisa demonstrar respeito, compreensão e atenção, bem como dedicação e preocupação com o paciente, familiares e/ou responsáveis. Deve discutir todos os pontos e as possíveis repercussões, explicando continuamente ações e condutas.


Conclui-se que os avanços da ciência e da tecnologia têm levado as pessoas a viverem melhor e cada vez mais. A cada 4 ou 5 anos, duplica-se o conhecimento. Portanto, muito se exige do médico, que deve estar atento a inovações diagnósticas e terapêuticas para que possa utilizá-las, de pronto, em benefício de seus pacientes.


Outrossim, apesar dos inúmeros avanços tecnológicos, a relação entre paciente e médico continua a ter destaque na terapêutica das patologias. Sem sombra de dúvida, o sucesso de um tratamento depende, em parcela significativa, da inter-relação estabelecida entre as duas partes. Confiança, reciprocidade, compaixão, autoridade (sem submissão) e atenção são fatores fundamentais no estabelecimento de uma relação médico-paciente ideal e, por conseguinte, indispensáveis para a condução adequada e o restabelecimento da saúde do enfermo.


Por fim, mas não menos importante, o médico deve ter consciência de que a sua atividade, ou seja, a terapêutica por ele empreendida, pode não trazer o efeito esperado e desejado. O paciente, por sua vez, também deve ser informado sobre todos os aspectos de sua doença, quais os tratamentos utilizados, possíveis complicações e riscos, bem como ter a total noção, desde o início, de que a Medicina, por não ser uma ciência exata, nem sempre traz a evolução esperada.


 


 


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