Coração partido

Coração partido

Por Dr. Pedro Ivo De Marqui Moraes – Cantou Drummond em Quadrilha que “João amava Teresa que amava Raimundo que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili que não amava ninguém”.


Quem nunca teve o coração partido por amor? Ou por rancor?


O estresse emocional intenso pode, literalmente, partir o coração. Trata-se de uma condição conhecida atualmente como Síndrome do coração partido, ou cardiomiopatia adrenérgica, ou ainda Síndrome de Takotsubo.


Em 1983, médicos japoneses descreveram o primeiro caso em uma mulher de 64 anos, com dor torácica tipicamente anginosa e alteração eletrocardiográfica compatível com isquemia miocárdica aguda (supradesnivelamento do segmento ST). O cateterismo cardíaco surpreendentemente mostrou uma alteração de motilidade do músculo cardíaco em toda extensão médio-apical na ausência de lesões obstrutivas em artérias coronárias. O aspecto de contratilidade miocárdica deficiente assemelhou-se à armadilha para pesca de polvo: takotsubo em japonês.


O mecanismo fisiopatológico que explica as alterações do coração não é completamente elucidado, porém envolve fatores como sobrecarga adrenérgica e aumento da concentração de radicais livres, catecolaminas e endotelina, em última análise culminando em uma disfunção endotelial, microvascular e celular. Felizmente a maioria dos pacientes recupera a função cardíaca após algumas semanas, porém há relatos de choque cardiogênico e óbito em uma pequena parcela de casos.


Mulheres possuem 10 vezes mais risco de apresentar a síndrome em relação aos homens, principalmente após a menopausa. Isso aponta para o efeito protetor que o hormônio estrogênio oferece ao sistema vascular, promovendo vasodilatação mediada por óxido nítrico como um de seus efeitos. Apesar disso, a cardiomiopatia adrenérgica pode ocorrer em qualquer idade, gênero ou etnia.


Situações de raiva, discussões interpessoais, roubos, luto após falecimento, perda de emprego, desastres naturais e separações são gatilhos capazes de provocar as alterações cardíacas. Estressores físicos como infecções sistêmicas graves, lesão cerebral grave (sangramento ou edema), abuso de anfetamina e liberação catecolaminérgica por feocromocitoma também são possíveis desencadeantes.


A integração entre corpo e emoção transita entre os extremos do bem-estar pleno às doenças psicossomáticas. O coração não fica fora dessa. Uma vida sem estresse não é possível, buscar o equilíbrio é. Afinal, “João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento, Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia, Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes, que não tinha entrado na história”.


 


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