Diagnóstico por Imagem dos Cavernomas do Sistema Nervoso Central

Diagnóstico por Imagem dos Cavernomas do Sistema Nervoso Central

As malformações vasculares cerebrais congênitas (MVCC) são o resultado de uma desorganização na diferenciação neuroectodermal entre as 3ª e 5ª semanas de gestação. As quatro grandes classes de MVCC são:


  • Telangiectasia capilar
  • Angioma venoso
  • Malformação arteriovenosa
  • Cavernoma

O cavernoma macroscopicamente apresenta-se como uma massa lobulada, bem delimitada e com um aspecto azulado fosco, em cacho de uva, contendo sinais de hemorragia em diferentes estágios. O seu tamanho é variável, de uma mínima lesão petequial de alguns milímetros de diâmetro a uma volumosa massa de alguns centímetros, podendo exercer importante efeito expansivo.


Os cavernomas podem estar localizados em todas as estruturas do sistema nervoso central, mas se posicionam preferencialmente nos hemisférios cerebrais. Além da localização intraparenquimatosa, podem estar situados no espaço sub-pial, na leptomeninge ou, mais raramente, no espaço extradural, na coluna vertebral, nos corpos vertebrais, espaço epidural, intradural e intramedular.


Epidemiologia:


Os cavernomas são lesões relativamente raras, representando 5 a 13% de todas as anomalias vasculares do Sistema Nervoso Central (SNC). Correspondem à segunda causa de MVCC sintomáticas, após as malformações arteriovenosas.


Antes do aparecimento da Ressonância Magnética (RM), os cavernomas eram diagnosticados cirurgicamente ou por meio de autópsia, obtendo-se poucas informações do paciente sobre a história natural desta doença. Após o advento da RM, tem-se observado um aumento significativo no diagnóstico. O cavernoma não apresenta predominância de sexo.


Existem duas formas de cavernomas: uma forma familiar, caracterizada pela presença de múltiplas lesões, mas podendo se apresentar sob a forma de lesão única; e uma forma esporádica, não familiar, em que a lesão é habitualmente única. As formas familiares representam entre 10 a 30% de todos os portadores.


Aspectos Clínicos e História Natural:


Os cavernomas podem ser assintomáticos durante toda a vida ou se apresentarem clinicamente, de forma aguda ou progressiva. Os sintomas clínicos mais frequentes são: crise convulsiva, déficit neurológico focal e cefaleia. Os pacientes acometidos de cavernoma medular apresentam como sintomatologia clínica: paraparesia progressiva, diminuição da sensibilidade e dores.


As hemorragias no sistema nervoso central, devido ao cavernoma, podem ser: intraparenquimatosa, intraventricular e subaracnóidea. O risco de hemorragia é maior na forma familiar e aumenta nos pacientes que já apresentaram um episódio hemorrágico pregresso. Os fatores biológicos podem influenciar no comportamento do cavernoma, podendo estar ligados aos estrógenos. O tamanho aumenta durante a gravidez, principalmente durante o primeiro trimestre da gestação e diminui logo em seguida após o nascimento. A forma familiar do cavernoma deve ser sempre pensada em paciente portador de episódio hemorrágico intraparenquimatoso de repetição, crise convulsiva ou antecedente de patologia vascular cerebral familiar.


Levando-se em conta a alta sensibilidade da ressonância magnética para a detecção de lesões cavernomatosas e a possibilidade de existência de uma forma familiar de cavernoma, propõe-se a realização de exames de RM em pessoas parentes em primeiro grau de pacientes acometidos de múltiplas lesões cavernomatosas, principalmente em casos com antecedentes familiares por crises convulsivas, hemorragia intracraniana e presença de morte súbita por patologia vascular cerebral na família.


A forma familiar de cavernoma é de evolução variável, necessitando de vigilância extrema, devido a possibilidade do aparecimento de novas lesões durante a evolução do tempo.


Diagnóstico por Imagem:


Os métodos de diagnóstico por imagem das lesões cavernamentosas do SNC são:


. Radiografia simples;


. Angiografia cerebral;


. Tomografia Computadorizada;


. Ressonância Magnética.


A radiografia simples do crânio é quase sempre normal, mas pode revelar raramente calcificações sem nenhum caráter específico. A angiografia é frequentemente normal, exceto em pacientes que apresentem lesão suficientemente grande para demonstrar um efeito expansivo importante. Às vezes, ela pode demonstrar um realce tumoral tardio, anomalias venosas de desenvolvimento e pequenos lagos venosos de contraste, mas de baixa especificidade.


A Tomografia Computadorizada demonstra lesões nodulares, espontaneamente hiperdensas ou heterogêneas, com mínimo efeito expansivo e tênue captação anômala de contraste. A detecção de hemorragia intracraniana é o achado mais frequente.


A Ressonância Magnética possui alta sensibilidade e especificidade para o diagnóstico de cavernoma, especialmente nos equipamentos de alto campo, com utilização de sequências sensíveis à detecção de hemoglobina e seus produtos de degradação como, por exemplo, a sequência em eco de gradiente e SWI, permitindo detectar pequenos focos de depósito de hemossiderina, que são a tradução de pequenas lesões cavernomatosas.


Na RM, aparece tipicamente com um aspecto em “pimenta e sal”, com sinal heterogêneo e multilobulado. Esta heterogeneidade de sinal corresponde a hemorragias ou tromboses esporádicas, em diferentes estágios evolutivos, com pequenas cavidades separadas por finas septações fibrosas. As calcificações podem contribuir também para a heterogeneidade do sinal. Os depósitos de hemossiderina, no tecido glial adjacente, tornam progressivamente mais hipointenso o sinal, na sequência em T2, T2* e SWI. Zabramski et al, em 1994, estabeleceram um sistema de graduação dos cavernomas, em um estudo com 159 pacientes portadores de cavernomas familiares, correlacionando o sinal com alterações anatomopatológicos.


Tipo1: centro hiperintenso em T1; centro hipo ou hiperintenso em T2 com um halo hipointenso anelar; a análise anátomo-patológica evidencia sinais de hemorragia subaguda, e ao redor da lesão nota-se depósito de hemossiderina.


Tipo 2: aspecto em “pimenta e sal”; reticulado, heterogêneo no centro em T1; sinal reticulado, heterogêneo com anel hipointenso periférico em T2; a análise anátomo-patológica detecta zonas lobuladas de trombose em várias fases, e calcificações acompanhadas por gliose e hemossiderina;


Tipo 3: iso ou hipointenso em T1; hipointenso em SET2 com um anel hipointenso que aumenta o tamanho da lesão; em EGT2-hipointenso com um grande aumento da “ausência de sinal” em relação a sequência SET2; a análise anátomo-palógica evidencia um aspecto hemorrágico crônico com depósitos de hemossiderina em torno da lesão.


Tipo 4: nas sequências SET1 e SET2 são pobremente visibilizados ou mesmo não são visibilizados; na sequência EGT2 são observadas lesões puntiformes, hipointensas; nota-se também nesse aspecto dois tipos de lesões: os cavernomas e as telangiectasias capilares.


Baseado neste estudo, considera-se que a RM é atualmente o método de imagem mais sensível e específico para detecção de lesões cavernomatosas, sendo considerado o método de diagnóstico definitivo. A RM, especialmente os equipamentos de alto campo, aliado às sequências sensíveis à hemoglobina e seus produtos de degradação, permitiram um diagnóstico precoce desta patologia, assim como uma melhor compreensão de sua evolução, auxiliando os profissionais a optar pela melhor conduta terapêutica o mais precocemente possível. Vários fatores de risco podem influenciar no dinamismo da lesão cavernomatosa no transcorrer do tempo. Por meio da RM, alguns fatores de risco puderam ser analisados. Destes, os mais importantes na análise evolutiva da lesão cavernomatosa são: forma familiar, múltiplas lesões, episódio hemorrágico pregresso e faixa etária precoce.



Imagem 1: RM-corte axial, SET2-1°ECO, densidade protônica forma familiar e grave apresentando múltiplas lesões, com algumas em aspecto heterogêneo circundado por halo hipointenso (seta grossa, e em outras hipointensas (seta fina)


   


Imagens 2 e 3: Cortes axiais sem injeção de contraste e RM- cortes axiais em EGT2; observar a lesão espontaneamente hiperatenuante ao nível da medula cervical, localizada lateralmente à esquerda, na TC; Na RM, a lesão se apresenta hipointensa na sequência EGT2. 



Imagem 4: RM, corte axial -a) SET2 -2°eco e b) EGT1 com contraste; na sequência SET2 nota-se a lesão cavernomatosa em topografia putaminal direita, na sequência EGT1 com contraste, observa-se pequena imagem filiforme que capta contraste compatível com anomalia venosa de desenvolvimento associada ao cavernoma.


    


Imagens 5 e 6:  a) TC sem injeção - corte coronal e RM-corte coronal  b) EGT2; c) EGT1 em coronal;  d) SET2- 2° eco no plano sagital. A lesão se apresenta espontaneamente hiperatenuante na TC; predominantemente isointensarm EGT1 com algumas áreas hiperintensas em seu interior, heterogênea em SET2 e predominantemente hipointensa em EGT2.


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