Lições do Universo da Hepatite C

Lições do Universo da Hepatite C

O Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (UFPR) promoveu, em maio de 2017, um interessante evento científico de atualização sobre a hepatite crônica C. Estiveram presentes profissionais médicos e não médicos que atuam em várias especialidades e áreas envolvidas, direta ou indiretamente, na atenção ao paciente com infecção pelo vírus da hepatite C (HCV). Entre os inúmeros aspectos apresentados, os que mais chamaram a atenção foram os seguintes:


Em primeiríssimo lugar, a resposta virológica sustentada (RVS), isto é, a ausência da detecção do RNA viral no sangue do paciente decorridos 6 meses do término do tratamento, atualmente, varia entre 95 e 100%. Essas cifras são surpreendentes, ainda mais quando se tem em mente que, apenas 10 anos atrás, a RVS girava em torno de 70%. O tratamento antiviral fornecido pelo Ministério da Saúde é composto por medicamentos tomados por via oral, chamados antivirais de ação direta (DAAs), 1 a 2 vezes por dia, por até 16 semanas, com poucos ou nenhum efeito colateral. Os regimes terapêuticos anteriores exigiam a aplicação subcutânea de alguma apresentação do interferon, peguilado ou convencional, e estendiam-se de 24 a 72 semanas (conforme o genótipo do vírus C). Em outras palavras, o paciente era submetido a um tratamento associado a inúmeros efeitos colaterais, de longa duração e cuja taxa de cura era bastante inferior.


Em segundo, é notável a superação dos incontáveis fatores de má resposta associados ao tratamento da infecção pelo vírus C. A preocupação com carga viral, grau de fibrose hepática, genótipo viral e raça, sexo e idade do paciente deram lugar a outras questões, como notadamente se há cirrose descompensada (classificada como Child B ou C). Isso porque a RVS é boa para todos os grupos de pacientes, inclusive para os cirróticos e os já tratados; mesmo aqueles com cirrose descompensada apresentam RVS elevada, embora as taxas de cura sejam inferiores (por volta de 85%).


Em terceiro lugar, o tratamento dos pacientes com coinfecção HCV-HIV acompanhou essa evolução de tal modo que tanto os esquemas de DAAs quanto a duração do tratamento do paciente coinfectado são os mesmos indicados para o monoinfectado (convém notar apenas que a indicação do tratamento difere um pouco, refletindo a história natural da doença hepática no paciente com HIV).


Quarto, a infecção pelo HCV está associada a uma miríade de manifestações extra-hepáticas, muitas das quais tendo a capacidade de interferir bastante com o funcionamento do paciente e exigindo atenção especializada. Assim, não apenas os médicos com formação em hepatologia ou infectologia abordam o paciente infectado pelo HCV, mas também os dermatologistas, psiquiatras, reumatologistas e hematologistas (para citar apenas alguns exemplos).


Todas essas mudanças no entendimento e manuseio da infecção crônica pelo HCV apontam para a importância de o médico permanecer atento para o seu aprimoramento e para a atualização dos próprios conhecimentos, dentro e fora da especialidade a qual o profissional dedica maior atenção.


Por fim, é importante ter em mente que os pacientes com infecção crônica pelo HCV submetem-se, por vários motivos, a avaliações de cunho administrativo feitas por médicos. Nesse tipo de situação, encontram-se os médicos do trabalho, os peritos médicos e os médicos auditores. Conquanto sejam médicos e avaliem problemas de saúde, o seu enfoque é diferente daquele próprio do médico-assistente. Enquanto os médicos clínicos preocupam-se com o bem-estar e a saúde do paciente a quem prestam assistência, os médicos “administrativos” respondem questões postas por normas legais, com vistas ao seu cumprimento. Correndo o risco de dizer algo que parece óbvio, a relação entre médicos-assistentes e médicos em funções administrativas deve ser harmônica e pautar-se pelo respeito mútuo.



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Referência


BRASIL. Ministério da Saúde. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Hepatite C e Coinfecções. 2016. Disponível em: http://www.aids.gov.br/sites/default/files/anexos/publicacao/2015/58192/arquivoweb4_pcdt_17_05_2016_pdf_31085.pdf. Acesso em: 18 mai. 2017.


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