Novo Calendário de vacinação da SBP inclui vacina contra dengue

Dr. Renato Kfouri, presidente do Departamento Científico de Imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), comenta nesta entrevista a inclusão da vacina contra a dengue no Calendário de Vacinação da Sociedade. Resultado de um novo trabalho conjunto (conduzido pelos Departamentos Científicos de Imunizações e de Infectologia da SBP), o documento traz as recomendações da entidade para a aplicação de vacinas em crianças e adolescentes.


GEN – O Calendário de Vacinação da Sociedade Brasileira de Pediatria acaba de ser divulgado e a principal novidade é a inclusão da vacina contra a dengue. Qual a razão para ser incorporada?

RK – A dengue é um enorme problema no Brasil, que leva a um prejuízo muito grande na saúde, incluindo ocupação de leitos e testes em laboratórios. Nos últimos anos, reportamos mais de um milhão e meio de casos, com cerca de 1.000 óbitos anuais. Sua incidência aumenta não só no Brasil, mas também em toda a América. Nos últimos 20 anos, o número de casos reportado cresceu em 7 vezes.


Tendo em vista este aumento, identificamos que seria necessária outra forma de combate ao vetor como medida preventiva. A vacina cumpre essa função, de acordo com as publicações de dados de eficácia e segurança. Por isso, a SBP incorporou em seu calendário a recomendação de imunizar as crianças e adolescentes contra dengue.


GEN – A quem será destinada esta imunização específica?

RK – A vacina está licenciada para pessoas de 9 a 45 anos. Esta é a faixa etária que os estudos demonstraram eficácia e segurança. No calendário da SBP, cujas recomendações se limitam a crianças e adolescentes, a vacina está indicada a partir dos 9 anos para aqueles que vivem em áreas de risco para a doença, a partir de um esquema habitual de três doses (0, 6 e 12 meses).


Ainda faltam estudos em gestantes, lactantes e indivíduos com HIV, pois, como toda nova vacina, foi estudada em um grupo pequeno e em uma faixa etária restrita. Por isso, a vacina não deve ser administrada em pessoas com imunodeficiências congênitas ou adquiridas, incluindo aquelas em terapia imunossupressora. Também não deve ser aplicada em gestantes, lactantes e pessoas que vivem com HIV/AIDS.


GEN – Como será a imunização?

RK – Esta vacina tem potencial importante para ajudar na prevenção das formas graves da doença. É a primeira desenvolvida contra a dengue no mundo e a única com registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Oferece proteção contra os quatro tipos do vírus da dengue. Segundo estudos, a proteção é de 93% contra casos graves da doença, redução de 80% nas internações e eficácia global de pouco mais de 60% contra todos os tipos do vírus. Nesse primeiro momento, a vacina contra a dengue não está disponibilizada no sistema público de saúde, por não constar no Programa Nacional de Imunizações. Está recomendada pela SBP e disponível somente na rede privada.


GEN – De maneira geral, como a SBP irá conscientizar a classe médica sobre a importância desta nova vacina?

RK – A SBP tem várias ferramentas de comunicação com seus associados. Além dos eventos científicos, congressos, encontros pela internet, o site e a publicação do calendário são uma referência para pediatras de todo o Brasil.


GEN – Falando no calendário, os textos das notas passaram a ser mais objetivos e detalhados. Isso poderá subsidiar os médicos em suas decisões? De que forma?

RK – Neste ano, o texto das notas foi atualizado e passou a ser mais claro e detalhado para subsidiar adequadamente os médicos em suas decisões. Dentre outros pontos, essas notas oferecem uma comparação entre o esquema de vacinas disponível na rede do Sistema Único de Saúde (SUS) e o esquema sugerido pela SBP. Esse trabalho materializa a continuidade de esforços conjugados dos departamentos científicos de imunizações e de infectologia, que elaboraram o documento após várias rodadas de discussões. Vale lembrar que os textos em que são apresentados dados técnicos e orientações sobre cada uma das vacinas são parte integrante do calendário e, portanto, devem ser usados pelos pediatras na orientação para cada caso.


A tabela é uma generalização, com recomendações para a maioria dos casos, mas é preciso lembrar que a recomendação deve ser individualizada, verificando-se o histórico e as condições clínicas.


GEN – Como é definido o papel do pediatra para que o esquema de vacinação das crianças e dos adolescentes seja mantido?

RK – O pediatra é o principal agente de informação e fonte de referência para a recomendação de vacinação. Por isso, sua atuação para a prevenção de doenças é muito importante. Ele tem papel-chave no esclarecimento de pais e responsáveis sobre a importância de se manter o esquema de vacinação das crianças e dos adolescentes em dia. Cabe a ele oferecer as explicações necessárias para que as coberturas se mantenham elevadas.


GEN – Abordando a cobertura das vacinas, algumas doenças foram consideradas erradicadas no continente americano. No Brasil, qual o panorama das que têm vacinas disponibilizadas?

RK – Rubéola, sarampo, varíola, poliomielite e síndrome da rubéola congênita são as cinco doenças erradicadas por conta da utilização de vacinas no continente americano. Trata-se de um enorme avanço e são exemplos de que podemos conseguir o controle dessas enfermidades. Depois da água potável, as vacinas são a melhor ação em saúde pública para promoção da saúde e redução de mortalidade infantil. São consideradas excelentes ferramentas devido a sua relação custo-efetividade, que, quando implementadas em larga escala, são capazes de proporcionar enorme impacto na saúde coletiva.

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