O modelo de controle-demanda ou de tensão no trabalho

O modelo de controle-demanda ou de tensão no trabalho

Por Dr. Leonardo Biscaia – Em 1979, Robert Karasek Jr. publicou um artigo intitulado Job demands, job decision latitude, and mental strain: implications for job redesign, no qual descreve a relação entre o que chamou de job strain – expressão ainda sem tradução correta para a língua portuguesa, mas cujo significado aproxima-se de “tensão no trabalho” – e duas características do trabalho (“latitude de decisão” e demanda do trabalho), avaliadas a partir do ponto de vista do trabalhador. No Brasil, o modelo de Karasek é conhecido por job strain (sendo necessário diferenciá-lo do método de avaliação ergonômica para as extremidades superiores de Moore e Garg) ou, ainda, por modelo demanda-controle-suporte.

 

A tensão no trabalho ocorreria quando o trabalhador referisse pouca latitude (ou liberdade) de decisão e demanda intensa no trabalho. A liberdade de decisão estaria associada a atividades de elevado nível de competências, capacidade de aprender novos conceitos, baixa repetitividade e possibilidade de decidir sobre o processo produtivo. Os fatores associados à demanda do trabalho, por sua vez, estariam relacionados ao trabalho rápido, muito pesado, sobrecarga de atividades, pouco tempo para cumprir tarefas ou terminá-las. A combinação de pouca liberdade decisória com demanda elevada no trabalho causaria uma série de sintomas de tensão, dentre eles: cansaço matutino, exaustão no fim do dia, depressão, nervosismo, ansiedade e problemas do sono, resultando no consumo de calmantes e em absenteísmo. O modelo demanda-controle permite inferir que essas manifestações tendem a aumentar ao longo do tempo se a tensão no trabalho permanecer elevada, mas podem ser modificadas com alterações na organização ou no conteúdo do trabalho.

 

A partir das duas categorias principais – demandas no trabalho e liberdade decisional, Karasek propôs quatro categorias derivadas, definidas a partir da combinação das duas principais: trabalho passivo (com baixa demanda e baixa liberdade de decisão), trabalho ativo (alta demanda e bastante liberdade de decisão), trabalho de pouca tensão (grande liberdade de decisão, mas baixa demanda) e trabalho de tensão elevada (alta demanda e baixa liberdade decisional), como visto na Figura 1.

 

Figura 1 Demandas de trabalho. Adaptada de Karasek RA, 1979.

 

Os achados de Karasek estabeleceram uma relação forte entre a insatisfação no trabalho e o índice de tensão, e, para a maioria dos trabalhadores, baixas cargas de trabalho estão associadas a mais satisfação (embora esta também aumente à medida que há mais pressão pelo cumprimento das atividades junto de grande exigência intelectual, sendo o oposto verdadeiro). De modo semelhante, o grau de atividade do trabalho (se ativo ou passivo) também é um componente importante da satisfação.

 

O modelo controle-demanda de Karasek mostra que há uma covariação entre o nível de atividade do trabalho e os indicadores de satisfação e de depressão, de tal modo que trabalhos ativos associam-se a mais satisfação e menos depressão e trabalhos passivos com menos satisfação e mais depressão. Além disso, apesar de a tensão elevada no trabalho estar associada a sintomas psíquicos, a “tensão mental” (mental strain) não guarda relação nítida com o trabalho passivo.

 

Nas situações descritas como trabalho ativo, além de haver mais satisfação com as atividades profissionais realizadas, há o que se pode chamar de “bom estresse”, no qual a pessoa tem motivação e consegue aprender novas competências.

 

Como resultado de uma pesquisa tanto longitudinal quanto transversal, que avaliou algumas centenas de trabalhadores suecos e estadunidenses, Karasek reconheceu limitações para o seu modelo. As diferenças individuais na percepção das demandas não são avaliadas mesmo quando usado um questionário autoaplicável que indaga justamente as impressões que os trabalhadores têm dos seus trabalhos. Além disso, outros aspectos relevantes são questionados pelo próprio Karasek, como a falta de consideração sobre o impacto das relações sociais no grupo e no contexto organizacional ou o efeito dos diferentes tipos de liberdade de decisão e demandas no trabalho.

Assim, o modelo controle-demanda de Karasek apresenta-se como uma ferramenta de grande utilidade para todos os envolvidos com Saúde Ocupacional. Dentre as características que demonstram o valor do modelo controle-demanda, a mais evidente é a possibilidade de aferir, de modo objetivo e de uma só vez, os efeitos percebidos pelo trabalhador tanto das demandas do trabalho quanto da liberdade decisória. Outra característica é a sua capacidade de predizer efeitos sobre a saúde do trabalhador, notadamente psiquiátricos, mas também cardiovasculares e ortopédicos.

 

Bibliografia

KARASEK, R.A. 1979. Job Demands, Job Decision Latitude, and Mental Strain: Implications for Job Redesign. Administrative Science Quarterly, v. 24, n. 2, pp. 285-308. Disponível em: http://www.jstor.org/stable/2392498. Acesso em: 01.fev.2018.

KARASEK, R.; BRISSON, C.; KAWAKAMI, N.; HOUTMAN, I.; BONGERS, P.; AMICK, B. 1998. The job content questionnaire (JCQ): an instrument for internationally comparative assessments of psychosocial job characteristics. Journal of Occupational Health Psychology, v. 3, n. 4, pp. 322-353.

 

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