Reabilitação cognitiva

Reabilitação cognitiva

Por Dra. Eliane Correa Miotto – A reabilitação cognitiva (RC) é um conjunto de procedimentos e técnicas que visam a promover o restabelecimento do mais alto nível de adaptação física, psicológica e social do indivíduo com prejuízos, incapacidades e desvantagens.1-3 Barbara A. Wilson4, uma das principais pesquisadoras nessa área, complementou a definição de RC como um processo no qual o paciente e seus familiares trabalham em parceria com os profissionais da área da saúde, a fim de possibilitar o alcance do potencial máximo de recuperação, bem como lidar ou conviver melhor com as dificuldades cognitivas, emocionais, comportamentais e sociais resultantes de lesão cerebral ou quadros neurológicos.


É importante ressaltar que o objetivo da RC deve sempre estar associado à melhora de aspectos e atividades no contexto da vida real do paciente. De maneira geral, os programas de RC podem apresentar as seguintes abordagens e objetivos:


  • Recuperar ou restabelecer a função cognitiva comprometida
  • Potencializar a plasticidade cerebral ou a reorganização funcional
  • Compensar as dificuldades cognitivas com meios alternativos ou auxílios externos que possibilitem a melhor adaptação funcional do paciente
  • Modificar o ambiente com tecnologia assistiva ou outros meios de adaptação às dificuldades individuais de cada paciente.

Há diferentes programas de RC apropriados a distintas fases do processo de recuperação (Figura 1).


Figura 1. Programas de RC na fase aguda e pós-aguda em quadros neurológicos



A literatura indica que o processo de RC deve ser iniciado na fase aguda ou pós-aguda, no próprio hospital onde o paciente está internado.5 Quadros que podem se beneficiar da RC nessa fase incluem traumatismo cranioencefálico (TCE), acidentes vasculares encefálicos (AVE), pós-operatório de lesões expansivas, encefalites, entre outros. Nesses casos, a RC visa a reestabelecer ou melhorar a capacidade de orientação temporal, espacial e pessoal do paciente, melhorar a aprendizagem, o armazenamento e a recordação de novas informações, aumentar o período de concentração em atividades cognitivas, melhorar os sintomas associados à depressão e à ansiedade, bem como outras alterações comportamentais.


É importante ressaltar que, tanto na fase aguda/pós-aguda quanto na crônica, o processo de RC inicia-se com uma avaliação neuropsicológica detalhada para mapeamento de habilidades cognitivas preservadas e alteradas, além de uma avaliação do comportamento, do humor e da funcionalidade do paciente.6 Após esse processo avaliativo, inicia-se o estabelecimento de metas de RC a longo e curto prazos, em parceira com o paciente, a equipe de profissionais envolvida e os familiares ou cuidadores.4-6


Os principais protocolos de tratamento na fase pós-aguda ou crônica incluem:


  • Reabilitação holística: intervenção integrativa das alterações cognitivas, comportamentais, emocionais, sociais e ocupacionais, incluindo programas com treino cognitivo, terapia cognitiva comportamental, orientação e reintegração social e ocupacional, terapia familiar e psicoeducação
  • Treino cognitivo: intervenção que visa a reduzir os déficits cognitivos por meio de técnicas e estratégias sistemáticas e estruturadas, com aumento gradativo de complexidade
  • Reabilitação cognitiva: intervenções direcionadas, de maneira individualizada, às dificuldades cognitivas e de vida diária do paciente
  • Estimulação cognitiva: conjunto de atividades cognitivas realizadas comumente em grupo, com o intuito de melhorar o funcionamento cognitivo global e social do participante
  • Psicoeducação e orientação para familiares e cuidadores
  • Adaptações e modificações ambientais
  • Intervenções comportamentais.

Nos últimos 10 anos, tem-se observado um aumento de estudos publicados que mostram a eficácia dessas intervenções. No entanto, para atuação nesse segmento no contexto brasileiro, é necessário ampliar a formação de profissionais da área da saúde.


Referências


  1. Organização Mundial da Saúde (OMS). International classification of impairment, disability and handicap. Geneva: World Health Organization,
  2. Organização Mundial da Saúde (OMS). World Health Organization. International Classification of functioning, disability and health: ICF. Organização Mundial da Saúde,
  3. Organização Mundial da Saúde (OMS). Rumo a uma linguagem comum para Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF). Geneva: Organização Mundial da Saúde, 2002.
  4. Wilson BA. Towards a comprehensive model of cognitive rehabilitation. Neuropsychological Rehabilitation 2002;12(2):97-110.
  5. Marshall S, Bayley M, McCullagh S, Velikonja D, Berrigan L, Ouchterlony D, Weegar K. Updated clinical practice guidelines for concussion/mild traumatic brain injury and persistent symptoms. Brain Injury 2015;29(6):688-700.
  6. Miotto EC. Reabilitação neuropsicológica e intervenções comportamentais. São Paulo: Roca, 2015.

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