Transtorno opositivo-desafiador: como identificar e tratar

Transtorno opositivo-desafiador: como identificar e tratar

O transtorno opositivo-desafiador (TOD) é um distúrbio comportamental disruptivo, externalizante, mais frequente na infância e na adolescência (acomete de 1 a 11% da população infantojuvenil; em média 6%)1, caracterizado por reações emocionais e temperamentais exageradamente descontroladas e irracionais frente a contextos que causam frustrações, decepções, espera ou mudança de planos.


Os acometidos pelo transtorno costumam xingar, agredir, quebrar ou jogar objetos, bem como destruir seus próprios pertences mesmo em situações não justificáveis. Tendem a ser “do contra”, sempre se opondo à opinião geral e aos condicionamentos da rotina impostos por figuras de autoridade. Mantêm discursos e posturas desafiadoras, ameaçam retaliar e resistir a qualquer contra-ataque de cuidadores e adultos, podendo, inclusive, desenvolver uma índole vingativa.2


Os sintomas podem começar a partir dos 4 anos e se tornarem mais visíveis dos 6 aos 10 anos, com piora na adolescência, caso nenhuma medida seja tomada. Até os 8 anos, o transtorno é mais comum em meninos, mas o quadro torna-se equivalente em meninas no alvorecer da adolescência.3


Costuma ser mais frequente em crianças em risco social, adotivas, institucionalizadas, que vivem em ambientes degradados e apresentam outros quadros, como o transtorno de déficit de atenção com hiperatividade (TDAH), o autismo e o transtorno de humor bipolar.4


O TOD causa frequentemente problemas de relacionamento entre os acometidos e seus pares, pais, cuidadores, diretores de escola e professores, desestabilizando as relações e impondo obstáculos ao crescimento emocional e ao surgimento de oportunidades dentro de um grupo familiar, escolar ou uma comunidade.


Os pais tendem a se sentir exaustos e desestimulados. São geralmente criticados pela escola e a própria família, o que lhes confere a sensação constante de incompetência para educar e de que jamais superarão essa “fase”. Chegam frustrados no consultório, choram e se acham no fundo do poço.


Não é de se surpreender: as reações emocionais exacerbadas e as atitudes brutas são assustadoras e costumam ocorrer diariamente. Passada a tormenta, minutos depois, a criança ou o adolescente se arrepende e pede desculpas, sinalizando que o comportamento saiu de seu próprio controle e real desejo. Contudo, uma espiral crescente de crises recorrentes e de frustrações familiares vai minando a integridade parental e filial e pode causar quadros depressivos e crises de ansiedade.


Apesar de começar sempre dentro de casa, os sintomas também podem se manifestar na escola, levando a problemas de relacionamento com professores e amigos, o que desencadeia dificuldades de aprendizagem. Urge, portanto, a busca por atendimento psicológico ou médico especializado; muitas vezes, a escola ou algum parente acaba sugerindo este caminho.


Desse modo, o diagnóstico depende de relatos dos pais e da escola e pode ser confirmado por critérios do DSM-5 e escalas estruturadas de avaliação e análise do comportamento do paciente nos diversos ambientes, inclusive verificando como ele age e reage em contextos variados.5 Sabe-se, por exemplo, que jovens opositores tendem a ser omissos frente a ordens e comandos. A intenção desta “omissão” calculada é deixar sem cumprir uma ordem para que possa acontecer o que querem que aconteça sem levar a culpa ou ser responsabilizado por não ter feito o que deveriam. Usam ainda de modo cansativo e incessante argumentos para justificar seus atos, mesmo quando explicitamente vazios ou sem propósito prático.  Conhecer todo o quadro possibilita ao avaliador perceber que se trata de uma condição neuropsiquiátrica e encaminhar para terapêutica especializada.


O tratamento sempre requer estratégias multidisciplinares e consiste em: medicações para autocontrole da raiva e para que o paciente consiga refletir e reagir de maneira mais assertiva; psicoterapias cognitivo-comportamentais para manejo parental e para suporte emocional e comportamental da criança na relação com autoridades e quando há sentimento de frustração; suporte escolar com reforço e apoio psicoeducativo (inclusive com a possibilidade de se contratar atendente terapêutico em casos mais graves) e tratamento de comorbidades.6


Por meio de estratégias psicoeducativas, é muito importante os pais ou os cuidadores e a escola modificarem o modo como conduzem a criança no dia a dia.7 Deve-se evitar, a todo custo, que o paciente evolua para um transtorno de conduta.  O TOD é modificável e, ao mesmo tempo, modulado, quando o ambiente reprograma meios de condução na relação com autoridades. Quando a criança/o adolescente percebe que ganhará mais recompensas positivas ao ser solidário com a autoridade, os sintomas do transtorno reduzem. Ao assumir novos comportamentos, a autoridade pode ser resgatada, fazendo com que o jovem perceba sua real posição na família e entenda que ganhará mais com a obediência e a compreensão de que ainda tem muito a aprender.


Referências bibliográficas


  1. American Psychiatry Association. Diagnostic and Statical Manual of Mental Disorders – DSM-5. 5.ed. Washington: APA; 2013.
  2. Serra-Pinheiro MA, Schmitz M, Mattos P, Souza I. Transtorno desafiador de oposição: uma revisão de correlatos neurobiológicos e ambientais, comorbidades, tratamento e prognóstico. Rev Bras Psiquiatr. 2004;26(4):273-6.
  3. Azeredo A, Moreira D, Barbosa F. ADHD, CD, and ODD: systematic review of genetic and environmental risk factors. Research in Developmental Disabilities. 2018;82:10-9.
  4. Noordermeeer SDS, Luman M, Oosterlaan J. A systematic review and meta-analysis of neuroimaging in ODD and CD taking ADHD into account. Neuropsychol Rev. 2016;26(1):44-72.
  5. Burke JD, Loeber R, Birmaher B. Oppositional defiant disorder and conduct disorder: a review of the past 10 years, part II am. Acad. Child Adolesc Psychiatry. 2002;41(11):1275-93.
  6. Andrade BF, Courtney D, Duda S, Aitken M, Craig SG, Szatmari P et al. A systematic review and evaluation of clinical practice guidelines for children and youth with disruptive behavior: rigor of development and recommendations for use. Clin Child Fam Psychol Rev. 2019.
  7. Lobo BOM, Flach K, Andretta I. Treinamento de pais na terapia cognitivo- comportamental para crianças com transtornos externalizantes. Psicol. Pesq. 2011;5(2):126-34.

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