Febre Amarela

Febre Amarela

Por Dra. Isabella Ballalai – O Brasil vem enfrentando desde dezembro de 2016 o maior surto de febre amarela silvestre de nossa série histórica, iniciada na década de 1980. De dezembro de 2016 a maio de 2017 foram confirmados 792 casos e 274 mortes pela doença, principalmente nos estados de Minas Gerais e do Espirito Santo. Em 2018, o cenário se mantém. De acordo com o boletim mais recente divulgado pelo Ministério da Saúde, de julho/2017 a janeiro/2018, foram 213 episódios confirmados, 435 em investigação e 81 óbitos. São Paulo lidera as estatísticas com 108 casos e 43 óbitos.


A situação é preocupante e demanda estratégias, envolvimento e mobilização conjunta de diferentes setores da sociedade. O Ministério da Saúde vem monitorando a situação epidemiológica e definindo as áreas geográficas onde a vacinação deve ocorrer de forma rotineira e, atualmente, faz o bloqueio do surto por meio da vacinação em massa em regiões de maior risco ou de circulação do vírus.


Doença infecciosa febril aguda, é causada por um arbovírus da família Flaviviridae. A transmissão se dá pela picada de mosquitos infectados, em dois ciclos epidemiológicos descritos: o silvestre – no Brasil, participam deste ciclo os mosquitos dos gêneros Haemagogus e Sabethes, sendo os macacos os principais reservatórios do vírus e o homem considerado hospedeiro acidental neste ciclo – e o urbano – quando os principais mosquitos do gênero Aedes passam a transmitir o vírus e, nesse caso, o único hospedeiro é o homem. Não se registram casos de febre amarela transmitida em ciclo urbano desde o ano de 1942.


A maioria das pessoas infectadas não desenvolve a doença. No entanto, para quem adoece, a febre amarela é doença grave que cursa, no Brasil, com letalidade de 30 a 50% dos casos. A vacinação é a forma mais eficaz de evitar a doença e bloquear o atual surto.


A maior parte do território nacional é considerada região com recomendação rotineira de vacinação. Diante dos casos ocorridos desde 2016, novas áreas de vacinação foram incluídas, inclusive o Estado do Rio de Janeiro, e são motivo de campanha de vacinação.


Saiba mais sobre a vacinação:


Vacinas disponíveis no país. Estão disponíveis duas vacinas: a produzida por Biomanguinhos – Fiocruz, utilizada pela rede pública, e a produzida pela Sanofi Pasteur, utilizada pela rede privada. Ambas são compostas de vírus vacinal amarílico vivo atenuado cultivado em ovo de galinha.


A vacina produzida por Biomanguinhos apresenta em sua formulação a presença de gelatina bovina, eritromicina, canamicina, cloridrato de L-histidina, L-alanina, cloreto de sódio e água para injeção.


Já a da Sanofi Pasteur contém: lactose, sorbitol, cloridrato de L-histidina, L-alanina e solução salina. Ambas têm perfis de segurança e eficácia semelhantes, estimados em 95%.


Uso de dose fracionada. O Ministério da Saúde adotou o fracionamento de doses da vacina contra febre amarela em 76 municípios de três estados: São Paulo, Bahia e Rio de Janeiro, com o objetivo vacinar mais de 19 milhões de pessoas em áreas de risco em curto prazo de tempo. A medida é segura e eficaz, além de recomendada pela Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS) como uma estratégia em situações de emergência. Apenas a vacina de Biomanguinhos pode ser fracionada.


Recomendações:


  • Para residentes em áreas com recomendação para vacinação, mas onde não há circulação do vírus (onde NÃO houve casos em macacos e/ou humanos) e para quem se desloca para estas áreas: vacinar todos entre 9 meses a 59 anos de idade, desde que não apresentem contraindicação.
  • Para residentes em áreas com recomendação para vacinação, onde haja circulação do vírus (onde HOUVE casos em macacos e/ou humanos) e para quem se desloca para estas áreas: vacinar todos a partir dos 9 meses anos de idade, inclusive idosos e gestantes, desde que não apresentem contraindicação.
  • Na rede pública, em municípios nos quais a dose fracionada esteja sendo utilizada, gestantes, imunodeprimidos (desde que não haja contraindicação médica) e crianças menores de 2 anos, receberão a dose padrão.
  • Para indivíduos em viagens para países que exigem a vacinação, segundo o Regulamento Sanitário Internacional, apenas a dose padrão será reconhecida para emissão do certificado internacional de vacinação e profilaxia (CIVP).

Importante: a vacina precisa de 10 dias para passar a proteger.


Grupos de Precauções:


Alguns grupos devem ser vacinados apenas quando expostos a risco de infecção pelo vírus da febre amarela. Nesses casos, o médico deve avaliar os riscos (possibilidade de se infectar versus possibilidade de evento adverso grave) e os benefícios para seu paciente (quando o risco de se infectar é maior que o risco de evento adverso grave).


São eles:


Nutrizes – O vírus vacinal da febre amarela é transmitido pelo leite. Portanto é como se estivéssemos vacinando o bebê. Pelo fato de a vacina ser contraindicada para menores de 6 meses, mulheres amamentando menores de 6 meses não devem ser vacinadas. Quando o risco de a mulher adoecer existe (região de circulação do vírus), a amamentação deve ser interrompida por 10 dias e sob orientação do pediatra para que o desmame não prejudique a criança.


Gestantes – Vacinas atenuadas são de risco teórico para o feto. Apesar de não haver na literatura médica relato de qualquer malefício ao feto, deve-se evitar a vacinação. No entanto, em situações de surto (em região de circulação do vírus), quando o risco de adoecer existe, a gestante deve ser vacinada.


Pessoas com 60 anos ou mais – Estudos indicam que pessoas com 60 anos ou mais têm mais chances, ainda que pequenas, de apresentarem eventos adversos graves, especialmente quando vacinados pela primeira vez. Entretanto, em situações de surtos (em região de circulação do vírus), o benefício da imunização supera os riscos que são teóricos. Cabe ao médico definir o que é melhor para o paciente.


Pessoas vivendo com HIV/Aids sem imunodepressão – Quando avaliado pelo médico e não houver risco para o paciente (CD4, viremia, entre outros critérios), devem ser vacinados.


Contraindicações:


A vacina está contraindicada para menores de 6 meses de idade; indivíduos com imunossupressão grave por doença ou tratamento; pacientes que tenham apresentado doença neurológica desmielinizante no período de seis semanas após a aplicação de dose anterior da vacina; pacientes submetidos a transplante de órgãos; pacientes com câncer; pacientes com história pregressa de doenças do timo (miastenia gravis, timoma, casos de ausência de timo ou remoção cirúrgica), e pessoas com história de reação anafilática relacionada a substâncias presentes na vacina (ovo de galinha e seus derivados, para as duas vacinas, e gelatina bovina no caso da vacina de Biomanguinhos).


Esquema de doses:


Hoje, a recomendação da Organização Mundial da Saúde e do Ministério da saúde é a aplicação de dose única, exceto quando utilizada a dose fracionada, quando dose de reforço pode ser necessária no futuro.


Eventos adversos:


Entre os eventos locais, dor no local de aplicação ocorre em 4% dos adultos vacinados, evento menos frequente em crianças pequenas, com duração de um ou dois dias, geralmente de intensidade leve a moderada.


Manifestações sistêmicas como febre, dor de cabeça e muscular não são raras, acometendo cerca de 4% dos vacinados pela primeira vez e menos de 2% nas segundas doses. Apesar de muito raros, podem acontecer eventos graves: reações alérgicas; doença neurológica (encefalite, meningite, doenças autoimunes com envolvimento do sistema nervoso central e periférico); doença visceral (infecção pelo vírus vacinal causando danos semelhantes aos da doença).


No Brasil, entre 2007 e 2012, a ocorrência desses eventos graves foi de 0,42 caso por 100 mil vacinados. Reações alérgicas como erupções na pele, urticária e asma acontecem com frequência de um caso para 130 mil a 250 mil vacinados. Entre 1999 e 2009, ocorreu anafilaxia na proporção de 0,023 caso para 100 mil doses aplicadas. Entre 2007 e 2012, aconteceram 116 casos (0,2 caso em 100 mil vacinados) de doença neurológica, principalmente quando se tratava de primeira dose e em idosos. Já a disseminação do vírus vacinal pelos órgãos, chamada “doença viscerotrópica”, nesse mesmo período, ocorreu em 21 pessoas (0,04 casos em 100 mil vacinados).


São dados americanos sobre as ocorrências desses eventos: evento adverso neurológico: 1,8 episódio para cada 100 mil doses aplicadas na população com 60 anos ou mais versus 0,8 para cada 100 mil doses aplicadas nos menores de 60 anos; visceralização: 1,4 episódio para cada 100 mil doses aplicadas na população com 60 anos ou mais versus 0,4 para cada 100 mil doses aplicadas nos menores de 60 anos.


Referências


  1. Sociedade Brasileira de Imunizações – Nota Técnica de 17/04/2017. Disponível em: https://sbim.org.br/images/files/nt-fa-sbim-170417.pdf.
  2. Sociedade Brasileira de Imunizações – Nota Técnica de 15/01/2018. Vacinação contra a febre amarela no Brasil: fracionamento de doses. Disponível em: https://sbim.org.br/images/files/nt-fracionamento-famarela-180116.pdf.

 


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