Efeito placebo e efeito nocebo: o que é isso na prática médica?

Efeito placebo e efeito nocebo: o que é isso na prática médica?

Por Dr. Celmo Celeno Porto – Potencialmente, haverá efeito placebo toda vez que houver interação de um médico com o paciente (placebo vem do verbo placeo, que significa agradar). Este efeito está embutido em qualquer tipo de tratamento. Daí a necessidade de se reconhecer a existência do “efeito placebo” ou da “ação droga do médico”, na expressão de Balint, como componente de suas ações, não só para compreender o que está acontecendo com o paciente, como também para tirar dele o máximo proveito na prática cotidiana.


Não se trata aqui do efeito placebo analisado em pesquisas clínicas, em que há outras implicações, quando o que se deseja é diferenciar a ação farmacológica de um fármaco de seu efeito não farmacológico. Para isso, existem técnicas estatísticas, a mais rigorosa é o ensaio duplo-cego e randomizado. Mas, na prática médica não é possível separar o efeito placebo de qualquer tipo de tratamento, incluindo intervenções e cirurgias.


A presença e a intensidade do efeito placebo estão relacionadas com vários fatores, entre os quais um se destaca: a qualidade da relação médico-paciente que, por si só, tem ação terapêutica.


Não se pode ignorar, contudo, que a ação do médico pode ter efeito contrário ao efeito placebo. É o que se chama efeito nocebo (do verbo noceo, que significa fazer mal, causar dano) ou efeito iatrogênico – que é quando se observa piora das condições do paciente, independentemente dos efeitos colaterais diretamente relacionados com a ação farmacológica do(s) medicamento(s). O efeito nocebo é mais provável de ocorrer quando o atendimento é de má qualidade, apressado e superficial, ou quando o médico profere palavras ou faz gestos que despertam dúvidas, medo ou angústia; ou seja, há estreita relação tanto entre o efeito placebo quanto com o efeito nocebo e a relação médico-paciente.


De maneira geral, o efeito placebo pode ser reconhecido nas seguintes situações:


(1) quando ocorre apenas em função do encontro de um paciente com o médico;


(2) quando surge conjuntamente com os efeitos específicos de uma intervenção terapêutica, sejam medicamentos, exercícios físicos, dieta, cirurgia ou qualquer tipo de intervenção;


(3) quando se usa propositalmente alguma substância ou se pratica alguma intervenção sabidamente inócua ou sem ação específica com relação a qualquer aspecto da “lesão” ou da “disfunção”, ou seja, na doença do paciente (esta última situação não é admitida na prática clínica, por ser antiética, ficando restrita a algumas pesquisas).


Em pesquisa, o efeito placebo é avaliado pelo uso de uma substância inócua por um grupo de pacientes, habitualmente denominado grupo placebo ou grupo controle, para fins de comparação com os pacientes que fazem uso da substância ativa. Aliás, cumpre ressaltar que pesquisas desenhadas com grupo placebo estão sofrendo restrições cada vez maiores. Isso porque, na maioria das vezes, tal recurso é injustificável do ponto de vista ético.


Sabe-se que o efeito placebo não se restringe à terapêutica com medicamentos. Exercícios, dietas e até intervenções cirúrgicas podem funcionar como placebo.


Há evidências de que há pessoas mais suscetíveis e outras mais resistentes ao efeito placebo. Há alguns estudos, inclusive, que procuram identificar o(s) tipo(s) de personalidade que corresponde(m) a uma ou a outra maneira de reagir. Todavia, nossos conhecimentos ainda são precários neste terreno. Uma coisa é certa: os efeitos placebo e nocebo estão relacionados com fenômenos psicodinâmicos, os quais, por sua vez, desencadeiam alterações neuro-humorais, que fazem parte de inúmeros outros mecanismos – psicoemocionais, bioquímicos, culturais – envolvidos no encontro clínico e na própria ação farmacológica dos medicamentos. Parece que os cientistas têm preconceito em relação a esses temas. As pesquisas são escassas e nem sempre realizadas com rigor científico.


Como se vê, o efeito dos medicamentos e de quaisquer intervenções, tem inúmeras faces, algumas totalmente ignoradas pelas escolas de medicina. Uma delas é o efeito placebo de todas as maneiras de tratamento.


É bem conhecido o fato de que muitos pacientes relatam que uma dor ou qualquer outro sintoma melhora ou desaparece pouco antes de ir ao médico ou logo após a consulta, antes mesmo de usar os medicamentos prescritos. Todo médico observa a “ação droga” ou “efeito placebo” do próprio médico. Aliás, o sintoma que melhor responde ao placebo é a ansiedade em suas múltiplas manifestações somáticas – precordialgia, insônia, náuseas, má digestão, dispneia suspirosa. Em função disso, muitas vezes os pacientes até deixam de adquirir os medicamentos ou os abandonam depois de usá-los durante poucos dias, pois o que esperavam deles já obtiveram ao se encontrar com o médico.


O efeito nocebo ou iatrogênico não pode ser negligenciado, havendo, inclusive, a proposta de se incluir na prática médica o que se chamou de “prevenção quaternária” para se reconhecer os mecanismos e as consequências do efeito maléfico de exames, medicamentos e intervenções.


Por este e outros motivos é bom que o médico não se esqueça de sua “ação droga”, que pode ser benéfica ou maléfica! O efeito placebo é o lado bom da ação médica, pois ele nos ajuda a cuidar dos pacientes.



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