Fístulas Entéricas
- 20 de mar de 2017
O tratamento conservador pode durar de algumas semanas até alguns meses e compreende:
- Reidratação, correção de distúrbios hidreletrolíticos e suporte nutricional:
Deve-se observar e corrigir desidratação decorrente de alto fluxo de líquidos perdidos pelo trajeto, hiponatremia, hipocalemia e acidose metabólica. Nessa etapa, apesar de, em virtude dos altos débitos provenientes das fístulas, o uso de suporte nutricional parenteral muitas vezes ser mais atrativo, deve-se considerar que 20% do aporte calórico estimado por via enteral são suficientes para proteger a integridade da barreira mucosa, assim como os aspectos imunológicos e hormonais do intestino. Deve-se, portanto, ter sempre em mente a importância da utilização da via enteral ou da combinação do suporte enteral e parenteral associados.
O uso de suporte parenteral exclusivo deve ser reservado somente para casos nos quais existam fístulas gástricas, duodenais ou de intestino delgado com alto débito, uma vez que o consumo por via oral ou enteral de nutrientes estimulará o aumento das perdas hídricas, de eletrólitos e proteínas pela fístula.
- Cuidados locais:
Deve-se observar atentamente:
– A origem da fístula
– As características do efluente drenado
– As condições da pele
– O local de exteriorização da fístula.
O uso de bolsas coletoras, preferencialmente transparentes, é considerado parte importante do tratamento, a fim de minimizar o extravasamento de líquido para a pele ao redor do local. Associa-se o uso de métodos de barreira para proteção da pele, podendo eles ser à base de talcos, pastas, sprays ou cremes, de acordo com a disponibilidade institucional, visando a proteger a pele sadia do efluente da fístula.
- Controle da drenagem da fístula:
Sempre que possível, deve-se orientar o trajeto da fístula para o meio externo, com um mínimo de contato com os tecidos ao redor, a fim de acelerar a recuperação. O uso de sondas do tipo Foley usualmente não resolve o problema e pode aumentar ainda mais o orifício fistuloso. Algumas metanálises sugerem que o uso de análogos da somatostatina, como o acetado de octreotida, inibem os hormônios gastrintestinais. Alguns autores propõem o uso da droga por três dias a fim de observar se houve redução do débito da fístula, sendo descontinuado o uso caso não se observe resposta terapêutica.
Cabe salientar que, mesmo nos estudos em que se observaram respostas favoráveis ao tratamento, não foi observada redução das taxas de mortalidade. O uso de TPN simplifica o manejo das fístulas enteroatmosféricas, uma vez que a aspiração contínua do conteúdo derramado na cavidade reduz o tempo de contato do conteúdo da fístula com o peritônio, controlando a contaminação local.
Uma estratégia que tem demonstrado eficácia diz respeito a orientar o trajeto da fístula por meio de sondas que devem ser exteriorizadas por contra-abertura em conjunto com o curativo de pressão negativa. Nesse contexto, boa parte do material drenado sai por meio de sondas e a pressão negativa estabiliza as sondas no local, coleta o líquido que extravasa ao redor do local e mantém pele e aponeurose íntegras para o reparo posterior.
Técnicas utilizando TPN a fim de otimizar o resultado do tratamento local têm demonstrado altos índices de resposta com controle das infecções e recuperação da área afetada. Devemos destacar que o escopo do tratamento é direcionar o efluente e manter a cavidade limpa enquanto estiver sendo tratada. Fístulas que surgem durante o tratamento com pressão negativa, em mais de 40% dos casos, estão correlacionadas a dispositivos artesanais do tipo Barker. Tal fato pode ser explicado pelo contato acidental das alças com compressas ou esponjas utilizadas e orifícios irregulares nos plásticos utilizados como barreira, levando a um sistema de aspiração não homogêneo próximo às alças intestinais.
Quanto ao tratamento cirúrgico:
Os pacientes que apresentam indicação para abordagem cirúrgica mais precoce geralmente são portadores de fístulas na parede lateral do duodeno, próximas ao ângulo de Treitz, assim como fístulas ileais, fístulas de alto débito e fístulas associadas a doenças intestinais, obstruções distais ou com eversão da mucosa (fístulas labiadas), que apresentarão menor tendência ao fechamento espontâneo. Recomenda-se aguardar entre 4 e 6 semanas após início das medidas clinicas a fim de observar a resposta ao tratamento conservador. Além disso, é recomendado que o tratamento operatório se dê após 3 a 4 meses do início do quadro para pacientes que não apresentem outras complicações. É fundamental para o planejamento terapêutico o conhecimento prévio da anatomia intestinal, a fim de permitir o planejamento tático. Para tanto, exames contrastados e tomografia computadorizada podem contribuir.
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